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Corpos sem Orgãos, por Ana Paula Pessoa (Grupo Interzona)


2 Comentários »

  1. |Nômades
    Terra Del Fuego

    Resolveu passar o dia de finados junto da esposa.
    Não, ele não foi ao túmulo dela, até porque não estava morta. Simplesmente ficou em casa em sua companhia.
    Dentro do lar, reinava um silêncio profundo e ela se vestira de preto. Todas as peças de roupas que ela usava eram da cor preta, como respeito ao dia dos mortos. Talvez, pela morte de algum parente, ou até mesmo prenunciando a morte do relacionamento, que de tão desgastado vivia moribundo.
    Ele, dentro do silêncio, lia a obra intitulada “Recordações da Casa dos Mortos” de Dostoiévski, divagando seus pensamentos de uma outra época, em que tanto ele como ela, eram mais vívidos. Às vezes um diálogo nascia, para logo em seguida fenecer, dada pela força da discussão que se aproximava, pelo afastamento de mundos diferentes que já nasciam em suas mentes.
    Lógico que havia esperanças, de retomadas românticas de outrora, porém não eram os mesmos desejos e sonhos. Até mesmo não eram mais as mesmas pessoas. Já haviam pensado, juntos, uma vida mais corrida, com projetos de compra de casa ou algum desejo consumista de propriedade.
    Na outra mão, que não segurava o livro, havia, um copo de cerveja com gelo. Costume dos dois. Ela já não bebia mais líquidos com teores alcoólicos. Suas mãos, também trêmulas, se agarravam a uma xícara de chá de camomila.

    Os diálogos iniciados, logo se interrompiam, pois sempre se divergiam, em propostas e imposições unilaterais, e mesmo quando eles haviam-se acordados em um assunto, se divergiam em discussões que só não se prosseguiam, neste dia, pelo fato de ser “dia dos mortos”.
    E o silêncio voltava, sem conforto, para ambos os lados.

    O branco em sua mente e a cor preta da roupa de luto da esposa, a todo instante, lembrava a ele, mais uma dor fúnebre: torcer para o botafogo era o mesmo que torcer para a morte eminente após sorrisos efêmeros de gols pseudo-alvissareiros para a conquista de um campeonato que se distanciava para lá de algumas décadas.

    À tarde, enquanto ela dormia, espalhou pela cama, metade do líquido contido na garrafa de cachaça, dada a ele como presente de aniversário, e em seguida riscou o palito com ponta de pólvora, na caixa com fósforo, e ateou fogo.

    Os bombeiros, após, disseminado o incêndio, encontraram um corpo carbonizado e o livro, intacto, de Dostoievski.

    Um ano depois, a (Interpol), polícia internacional, prendeu o velho, acusado de homicídio e piromania, na cidade de Terra Del Fuego, na Argentina.

    Jose mauro fernandes

    Comentário por ze mauro zigfrid | 01/09/2008 | Responder

  2. Bacana a idéia do blog…vamos acompanhando daqui…Parabéns!E molhemos as palavras! Bosco

    Comentário por pontokom@hotmail.com | 06/06/2011 | Responder


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